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terça-feira, março 06, 2007

UM POUCO AIS SOBRE O AÇAÍ - OURO NEGRO DO AMPÁ


O OURO NEGRO DA AMAZÔNIA (AMAPÁ)

No âmbito do bioma amazônico, a floresta densa de terra firme tem a maior representatividade, reproduzindo-se no Estado do Amapá com 74,58% de cobertura do território amapaense (Macrodiagnóstico do Estado do Amapá-2002).
Vista de fora, a floresta densa de terra firme do Amapá transmite ao observador a aparência de uniformidade, quando na verdade apresenta diferenciações internas, em alguns casos capazes de “tipificar” espacialmente a floresta. Dentre essas diferenciações chama a atenção hoje – valor econômico – os sítios naturais de açaí (Euterpe oleraecae Mart) ocorrendo na extensão do maciço florestal, porem, ligados a povoações de fundo de vales e margens de pequenos rios, igarapés e outros mananciais, que os “alimentam” com águas permanentes ou de acumulação pluvial. Nessas condições formam-se os popularmente conhecidos grotões, grotas, baixios, quase sempre coincidentes com ocorrências de nascentes fluviais.
Sabendo-se que a maior parte da floresta densa de terra firme no Amapá localiza-se sobre terrenos movimentados, infere-se que são numerosas as “linhas” de\drenagens permanentes que, no geral, significam “condições favoráveis” ao estabelecimento de populações naturais de açaí. Mas não é só isso, também são extensos os maciços florestais de várzea, paisagem que domina todo o espaço amazônico ribeirinho desde a foz do Rio Amazonas no oceano Atlântico até a foz do rio Jarí no Amazonas.
Esses maciços florestais também comunicam uniformidade fisionômico de fora para dentro, mas estratificados conforme o porte de suas árvores e a ocorrência de palmeiras. São vastamente recortados por intrincada rede de drenagem, cujas águas ricas em sedimentos argilosos em suspensão aportam enormes quantidades de materiais disponíveis para a “formação” da várzea alta e baixa, que concorrem para a formação desses ambientes, propícios ao surgimento e a manutenção natural de grandes açaizais.
O açaí (Euterpe Oleraceae Mart.) é a palmeira de maior destaque em importância socioeconômica nas várzeas que ocorrem ao longo do rio Amazonas e afluentes, sobretudo nas localizadas em áreas de influência flúvio-marinha (como as várzeas da costa amapaense e do estuário amazônico). Possivelmente, sua utilização pelos ribeirinhos remonta os tempos pré-colombianos. Os frutos do açaizeiro têm servido de base de alimentação para milhares de pessoas, in natura ou em forma de vinho, contribuindo para manter a população local longe do estado famélico que caracteriza as populações rurais de outras regiões do País, apesar da pobreza latente do interior amazônico.
O açaí processado e congelado é comercializado para os grandes centros consumidores do Brasil, como São Paulo e Rio de Janeiro, e já se prepara para exportar para outros países, como Austrália, Suíça e Estados Unidos. O açaí é uma das principais fontes de renda para as comunidades ribeirinhas da Amazônia.
Outro produto do açaizeiro bastante demandado é o palmito, cujo destino é abastecer os supermercados das grandes cidades. A crescente procura por marreteiros (comerciantes ambulantes que visitam as comunidades do interior da floresta periodicamente), que suprem as fábricas de beneficiamento, aliada à falta de informação dos ribeirinhos, tem diminuído os estoques de açaí a ponto de desencadear distúrbios no padrão de vida de
algumas comunidades que exploram a palmeira.
O histórico dos planos de manejo de açaizais nativos tem mostrado a predominância de planejamentos voltados quase que exclusivamente para o
aproveitamento do palmito.
Mesmo em regime comunitário, os planos de manejo de açaizais resumem-se em operações de plantio, condução da regeneração natural, corte das palmeiras selecionadas e transporte da matéria-prima até as fábricas. A extração dos frutos, por ser uma atividade bastante corriqueira e sem danos aparentes ao meio ambiente, não justificaria a apresentação de um plano ao Ibama, com todas as exigências burocráticas.
A utilização dos frutos é mais vantajosa para os ribeirinhos - tanto econômica quanto social e ecologicamente - do que o uso do palmito. Com o corte de 1.000 cabeças de palmito (as pontas dos estipes), a uma média de R$ 0,25 por cabeça, o caboclo pode obter R$ 250,00 - aproveitando o estipe uma só vez, ao contrário do que acontece na extração do fruto. Estudos têm apontado que o manejo florestal pode aumentar a produção de frutos em até 30%, gerando uma renda bruta média de R$ 470,00 mensais (estimativa oriunda de experiências realizadas em comunidades ribeirinhas do município de Gurupá). Nestes valores já está incluída a venda do palmito retirado daqueles estipes mais velhos e com a produtividade em declínio, que no manejo são abatidos para a maior entrada de luz na mata. Os custos são mínimos. Tal receita está acima da média de municípios como Gurupá, onde o sindicato dos trabalhadores rurais calcula uma renda média mensal familiar de dois salários mínimos.
Ecologicamente, o manejo florestal preferencial aos frutos de açaí é benéfico por manter uma quantidade bem maior de estipes na área, sem forçar a resiliência (capacidade de recuperação) da floresta, o que não ocorre em casos de manejo exclusivo para palmito. Garante também a alimentação de pássaros e mamíferos e evita maior incidência de plantas invasoras e espinhosas. Finalmente, nos aspectos sociais, o aumento da produção de frutos e de vinho é uma segurança para a subsistência das comunidades.

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