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segunda-feira, fevereiro 08, 2010

RAIMUNDO LOBO - DIARIO DO AMAPÁ - 07 FEV

ARAPARI GIGANTE


Raimundo Lobo*

Na caiçara de casa, em Aporema, existia um arapari-gigante próximo à margem do rio. O seu tronco media cerca de um metro de diâmetro; a altura chegava a trinta e oito metros; os galhos eram grossos e potentes; as raízes médias e grandes se estendiam com vários metros de distância. No período da florescência, cobria-se com dezenas de milhares de flores. Os frutos no inverno eram comidos por tracajás e, no verão, por porcos domésticos e mais alguns animais. Também no verão essa enorme árvore servia de mutá, desanso ou dormitório de borrega, patos-bravios, maguaris, jaburus-moleques, garças-brancas-grandes, cacaraís, corocas, garças-reais, etc. No inverno, à noite, suas raízes davam abrigo aos tucunarés, acarás, aracus-pretinhos, jacundás e outros peixes menores. Decorridas muitas décadas, o velho arapari começou a morrer: foi ficando seco, oco e mais baixo. Nos buracos dos galhos moravam morcegos, ratos, aranhas, cupins, lacraus, baratas, cabas-de-telha, cobras, etc. Nele se aninhavam urubus, patas-do-mato, marecas, corujas, papagaios, pica-paus e outras aves. O seu último dia aproximava-se célere, até que, certa madrugada de junho de 1999, ouviu-se o estrondear fantástico de sua queda. A água logo invadiu todos os buracos, desalojando, afogando ou matando os seus ocupantes que eram incontáveis. Desses animais, sobreviveram ao afogamento muitas aves, mocegos, baratas, cabas e bons nadadores como ratos, aranhas, cobras e outros animais. Peixe de várias espécies foram atraídos para esse local de comida abundante: piranhas, mafurás, pacus, sardinhas, acarás-pretos, aracás-roxos, acarás-barbelas, apaiaris, acarás-galos, corriqueiras, aracupinimas, aracus-pretinhos, traíras, jacundás, aruanás e outros. Depois de algum tempo, os burracos desocupados no fundo tornaram-se abrigos ou moradas de acarás-pretos, acarás-roxos, ituís e anujás.

Já sabemos que as aves com seu belo e emocionante canto saúdam o Sol. Outros animais também homenageiam o Sol: os peixes vêm à tona, velozes e rebojam de alegria, muitas vezes lançando água para o alto; as guaribas guiadas pelo seu chefe e maestro, o congo, prestam em coro o seu preito à lâmpada celeste do alto de grandes árvores; no verão os bovinos acordam muito cedo e, em grandes filas indianas, fazem longas caminhadas; as cigarras-rezadeiras com seu canto monótono e penetrante saúdam a estrela da vida!

O beija-flor é a menor e a mais veloz ave do planeta. Não é pacífico como muitos pensam. No bebedouro, briga quase sem trégua, por alimento, amor, território e pontos de pouso, dando bicadas e esbarrões em alta velocidade, em outros de sua espécie. Dia 20-08-08, às 7h00, um colidiu com um arame de corar roupa, em elevada velocidade, caindo no chão com uma asa quebrada. Coloquei-o numa caixinha de papelão bem-ventilada com alimento para ele. Imóvel e triste, às 15h00, a avezinha morreu silenciosamente! Hoje, essa linda avícula está no Labratório de Zoologia da UNIFAP.

Tenho muitas décadas de convívio direto com a natureza. Muitas vezes eu saía para pescar às 4h00 e só voltava a casa, às 20h00. Hoje eu sinto que houve uma vivenciação e integração entre mim e a natureza. Agora, mesmo muito distante, no tempo e no espaço, como que ouço os emocionantes cantos dos quero-queros, das arirambas, das piaçocas, das águias-pescadoras, dos sabiás, das saracuras, dos aracuãs, dos xexéus e das marrequinhas. Como que vejo o pujante e belo verdor dos campos, das ilhas, das matas ciliares, dos imensos mururezais, os pores-do-sol multicores e apaixonantes, os luares vestidos de ouro ou prata, envoltos por milhões de estrelas resplandecentes. Tudo isso não me está só na memória. Está, sim, penetrado, entranhado, arraigado, integrado no âmago do meu ser e na essência da minha alma!

"O beija-flor é a menor e a mais veloz ave do planeta. Não é pacífico como muitos pensam. No bebedouro, briga quase sem trégua, por alimento, amor, território e pontos de pouso, dando bicadas e esbarrões em alta velocidade, em outros de sua espécie. Dia 20-08-08, às 7h00, um colidiu com um arame de corar roupa, em elevada velocidade, caindo no chão com uma asa quebrada.”

*Professor – Dicionarista – Escritor.

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