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sexta-feira, março 30, 2012

DO CHICO ANISIO PARA O PASQUIM (no áureo tempo da ditadura).


O ANJO                                             (O PASQUIM - Nº 4- julho – 1969)
Chico Anisio

Esta é uma das grandes diferenças que há entre nós: eu prometo e entrego; você promete e não entrega. Claro que há outras diferenças, claro. Você é Flamengo e eu, como tenho imaginação, sou America, mas isso já é esnobar e longe de mim a intenção de ser o motivo de sua psicanálise (Não faz? Mas precisa!). O Sergio Cabral me falou numa tarde no Maracanã que queria uma colaboração minha para O Pasquim (que enquanto não pagar disso não passará) e aí então vão logo duas. É lógico que nenhuma das duas presta, mas pelo preço, você queria o quê? Sendo eu um profissional, não fica bem para a minha cara esse negocio de trabalhar em troca de “muito obrigado”, ainda que seja o seu “melhor muito obrigado”, como costumam dizer os locutores de TV. Eu soube, da chamada fonte limpa, que o seu admirável mestre Millôr Fernandes anda trabalhando de graça para O PASQUIM. Eu sei que isto é uma desculpa que anda preparando para o Imposto de Renda. Não sei como ele conseguirá, mas que vai conseguir, disso tenho certeza. Mas o Millôr, convenhamos, é um humorista nacional-de-Ipanema e este não é o meu caso, posto que o sabe o próprio Mao-Tsé-Tung, eu sou muito mais importante, por ser um humorista MARANGUAPENSE-DO-BRASIL.
Excluindo a naturalidade de nós dois(minha e do Millôr, porque você não tem a menor naturalidade – coisa que qualquer um pode comprovar em qualquer bateau ou jirau após os primeiros uisques) ainda há um ponto que é exclusivamente a meu favor: o Millôr é limitado, escreve apenas para teatros, jornais, revistas, almanaques, folhetos, anúncios classificados etc.
Quanto a mim, só não escrevo para o etc., mas ainda castigo uma televisãozinha, um radiozinho e um disquinho. Ora, meu caro Tarso: perto de mim, que sou um pênalti, o Millôr não passa de um tiro de meta. Eu disse META Tarso, no meta você o dedo no meu raciocínio. Se eu, em troca da limitação preguiçosa do Millôr ofereço ao PASQUIM o ecletismo do meu humor, não posso concordar em trabalhar de graça para ninguém.
Nada, você paga ao Millôr. Eu só trabalho pelo dobro – e com isenção do imposto. Imposta esta clausula, no caso de ser aceita pelos diretores irresponsáveis deste semanário, telefone para o Hotel Savoy dizendo-me se quer mais. E não me queira convencer a pagar um dólar a menos do que exijo. Se for de todo impossível conseguir reunir os poucos 145 diretores do jornal, que você obtenha, pelo menos, o voto (bola branca) de uma maioria absoluta, porque o relativismo me deprime.
E pensar que eu esnobei uma “nota” da Realidade, para trabalhar por um preço destes para vocês. A cada dia eu saio mais da realidade, né?      
Com um abraço e um chivas.
Chico

Obs¹: Na outra contribuição ao O PASQUIM mencionada, Chico conta o caso do “anjo” que dormia com a mulher do vizinho, e que só se deu mal quando pegou a mulher do ateu
Obs²: Nessa Edição d’O PASQUIM, o fradinho disse sobre o Chico: “O maior show-man do Brasil dispensa o Ghost-Writer”     

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